Na década de vinte, uma Harley-Davidson era feita de modo totalmente artesanal, sendo cada exemplar o resultado do trabalho de poucos operários. Hoje, uma Bimota Tesi é igualmente exclusiva e feita pelas mãos de italianos extremamente focados em qualidade de acabamento. Esses são casos de um passado distante e de um presente quase irreal, pois a realidade que vemos é outra.
O capitalismo presenteou o mundo com soluções que facilitam a vida e, de brinde, tornou acessível objetos que antepassados jamais sonharam ter por estarem financeiramente distantes. De outro ponto de vista, entretanto, transformou tudo em mercadoria sem valor sentimental.
Há vinte anos a Brastemp era reconhecida pela qualidade de seus produtos e poucos concorrentes conseguiam atingir o nível de confiabilidade dos eletrodomésticos dessa empresa. Atualmente qualquer rival consegue fazer igual ou melhor e vender mais barato. E o pior: empresas como a Brastemp compram produtos das concorrentes chinesas e colocam suas marcas!
Como geladeiras e fogões, as motos se transformaram em coisas que podem ter qualquer marca, como provam algumas motos sem logomarca expostas no Salão Duas Rodas.
Até algumas empresas tradicionais pouco se importam com sua personalidade construída ao longo de décadas.
A grosso modo, quem compra japonesa, americana, inglesa ou alemã tá levando para casa uma chinesa. Já podemos tratar as fábricas conhecidas como sendo nipo-chinesas, austro-chinesa, teuto-chinesa, anglo-chinesas e ítalo-chinesas...
A questão reclamada é o modo de desenvolvimento, produção e comercialização das motos atuais, sobretudo das pequenas e acessíveis. Antigamente uma moto era lançada após anos de projeto e na linha de montagem recebia tratamento especial, com peças cuidadosamente cromadas e montagem elogiável. Hoje os escapamentos são pretos para facilitar o trabalho das fábricas.
Um fato muito estranho e preocupante que vem ocorrendo ultimamente é a comercialização de motos em lojas de departamento. Muitos dos vendedores desse tipo de comércio sequer sabem vender um aspirador. A venda de uma moto deve ser composta por um ritual cheio de detalhes fundamentais, sendo o mais importante deles o ato da entrega ao proprietário.
Em lojas de departamento ― e em muitas concessionárias ― o importante é a aprovação do crédito ou o recebimento do dinheiro. O cliente que se vire com plano de revisões, cuidados com os pneus e freios novos, o amaciamento do motor, enfim. Para muitas empresas cliente bom é aquele que compra e só aparece para comprar novamente.
O que puxou esse assunto foi a notícia da criação da Flash Motors, pela CR Zongshen. A intenção desta empresa é criar uma linha acessível às camadas menos abastadas. É criar uma submarca. A Toyota também fez isso com a Scion e a Volkswagen com a Skoda, mas elas têm nomes valiosos. Será que o valor do nome Kasinski é tão alto a ponto de ser necessário criar outra marca para vender produtos baratos? Creio que não.
As motos da Flash serão vendidas pela rede Máquina de Vendas, composta pelas lojas City Lar, Insinuante e Ricardo Electro. Vendedores que pouco entendem de aspiradores e geladeiras terão que fornecer informações como procedência, potência e assistência técnica das motos aos clientes. E eles sairão com elas dentro de caixas, só pode ser.
Há um grande problema em tudo isso que não só os entusiastas terão que suportar, mas a sociedade inteira. As motos-eletrodomésticos serão vendidas em infinitas prestações a adolescentes e idosos que tenham apenas vontade de passear motorizados e margem no crédito consignável.
(Minha opinião)
Aqui em minha cidade já pude sentir o efeito de quem vende motos como que fosse fogão, geladeira, etc.. Comprei um scooter Kasinski em 2009 e quando fui trocar por um modelo 2011 os inteligentes falaram que não recebem motos usadas (detalhe...da mesma marca) fiquei puto da vida e deu vontade de tocar fogo na marca Kasinski.